e nova
mente
se deita sobre seus ombros troncos
no aconchego de musgo santo


se reinvertermos todas as ordens do dia
chamamo-nos

orquídeas

(com voz de locução:
as orquídeas são plantas maioritariamente epífitas, crescem geralmente em árvores, usando-as somente como apoio para buscar luz. Não são plantas parasitas. Possuem muitas e variadas formas e cores, já que essa planta reproduz-se facilmente entre espécies semelhantes.)

eu, num tronco flor
tu, numa flor tronco

rediviva

o que é terno nunca acaba.
estou só
e tão só.

cada vez mais só
individualizada

que as pessoas a minha volta
pouco ou nada fazem falta

(desde criança tenho esse medo tanto
de ser abandonada
que não me sinto realmente
apegada a nada)

pode ser uma qualidade
mas daqui só dói

por que de fato, a alma antiga
sabe que nada é perene
nem os rios
nem as lavas
e nem as pedras imaginadas
(ainda que de tão lentas parecem eternas)

e eu que
ora lava
ora rio
também sei mostrar-me
passageira.
de todas as mortes
supreende-me ainda as que não são minhas.

flora cindi gray
se foi numa segunda feira
me deixou só entre os homens da casa
me contaram em detalhes
(que eu vos poupo)
como ela se foi.
não quis mais pensar

e imaginei assim:
ela foi acalmando
acalmando
acalmando
e encontrou todos que já se foram
amarelos em baixo de cobertas
ouvindo flautas transversais
branquinhas arredias
(sua irmã inconfessa)
minha negra guardiã
fizeram uma serenata
regada a telhado
miaram que se fartaram

agora, lá deitada
no sol da manhã eterna
do primeiro dia de primavera
ela me protege
(com eles todos)
com a falange de amor
do meus gatos-anjos.

(prá flora, que se foi dia 25/08)
era ela
(mas era também a lua)

linda, alva, resplandecente
como na minha memória adolescente
em que ela, satélite
soltava a voz

era (talvez) a lua
e era ela
errando pelo céu-casa
dentro da sua órbita
pensamento

(por dentro da lua,
desenhado ao pé de são jorge
ou de um coelho
umas dores insondáveis
que daqui da terra pensamos:
como que lá do céu tem essa dor?
mas é a dor de quem
aguenta sem fim a luz do sol
e resplandece num canto)

era a lua
era ela
e eu era
encantada
era eu
a lua
e o sol
tatuado
nos ombros
vendo ela
vendo a lua

não precisando mais nada
tentando pensar assim:
isso que nasce aqui em mim
isso só pode ser a lua

mas sabendo que era ela.

era a lua nada
era ela mesmo.
as coisas perdem a pose
as palavras fazem poças
e eu,
pensando- me em posse de mim,
saltito por elas, desvio

(é possível marejar águas turvas
e eu
passiva -
passo
rasante)

pode ainda ser pior:
se tropeço
piso na
poça-palavra-da-alma-mal-cuidada
rio-me logo da poça-lago
cresce amedronta arde dói
rio-lágrima (também)
empoçada por dentro

é água tanta que
a poça,
aposto,
já se foi
e agora
a regra
é a ilha
o tronco
pedaço de pau a boiar

por um fio seguro (-me)
e a mínima boca não se apossa do ar
pulmão embotado se opõe ao dia de sol
(tinha uns dias assim com você ao meu lado?)

(o coração dependurado pela boca
pede guarida desesperado
àquelas que já impingiram tanta dor
e hoje já olham serenas para quem agora sou.
depois de um tempo acalma
a dor
a d o r m e c e
-quase se vai-
fica só uma marca:
amor)

mas se
- disseram-me -
"é necessário!"
pela dor
perpasso
percorro o
percurso
das águas
rememorio-me

da dor
ao amor
saltito
tropeço
recaio
no fundo
do poço
o mais fundo
que posso.
as vezes dói por dentro tanto que não dá prá ir muito além do respiro
nesses momentos uns encontros
enterramos mortos e desejamos não estar lá ainda
abraçamos os irmãos
planejamos os futuros
(ainda com sonhos aos pedaços)
reclamo muito pouco
trabalho muito
penso em não pensar bobagens
vejo harry potter entre os mais queridos
vou na casa dos meus ídolos ficar de butuca em como esses seres galácticos vêm prá Terra fazer valer o dom.
penso nos meus dons
agradeço agradeço agradeço
e ainda dói
respiro e
agradeço.

eu não sei quando é hora de parar eu mimo as pessoas eu vou além dos meus limites eu procuro minhas possibilidades eu declaro amores eternos (e acredito neles) eu amo incondicionalmente eu me entrego inteira eu quebro a cara com as dez eu levando e sacudo a poeira eu caio de novo eu refaço meus planos eu jogo os planos fora eu improviso eu não sei o que fazer com tanto amor em mim eu ardo por dentro eu choro em padarias eu me irrito com estranhos eu tento de novo eu me torno adolescente eu vejo uma velha em mim eu revejo as metas eu não quero mais eu procuro afeto eu roo as unhas eu falo os plurais eu uso mesóclises eu gosto de proparoxítonas eu gosto de mulheres (e tenho medo delas) eu gosto de homens (e eles têm medo de mim) eu tenho medo de tudo eu dou a mão pro medo e caminho eu procuro o infinito eu (também) caí do paraíso de onde você veio eu quero voltar pra lá eu contemplo o inferno eu entro onde não sou chamada eu me obedeço eu me boicoto eu me realizo eu presto atenção em estranhos eu tenho um tédio existencial profundo eu amo minha vida eu amo a vida eu amo estar viva eu não compreendo os mistérios eu não compreendo o eterno eu aceito o desafio eu já não roubo lojas eu como chocolate escondida (de mim) eu como você escondido dos outros eu não te como mais eu acredito em deus eu já vi o capeta (ele piscou pra mim) eu planto árvores em lugares que não permaneço eu nunca permaneço eu transmuto eu alquimizo eu sou como água eu sou feita de fogo nas ventas eu sou ventania na labareda eu sou fogo em alto mar eu sou próprio mar eu sou a gota solta no mar eu sou o meio do meu equilíbrio eu caio na rua eu raramente ando de metrô eu tenho um milhão de amigos eu tenho 7 namorados e 7 namoradas (e amo todos!) eu falo mais do que devia eu perco o amigo eu não perco a piada eu sou amiga das ex eu sou ex de uns e de outras eu sou ana de amsterdã de são paulo do brasil e eu também sou daza eu não sou mais dela nem da outra eu já sou outra e ainda outra e ainda outra e ainda outra eu me perco na mutação eu sou a própria mudança eu sou o ato de mudar eu me mudo eu mudo eu e o mundo eu sou imunda em sou como limpidez após bruma eu sou também a própria bruma eu esvaio em sangue suor e arte eu sou a minha construção eu sou a obra de arte em mutação eu sou o que fiz de mim eu calo eu me calo (eu tenho vários calos) eu tenho cicatrizes na carne na pele na alma eu quero conhecer as almas alheias eu me interesso pelo próximo eu (também) já fui marxista eu (também) já fui bacante eu já li freud eu já fiz análise eu acordo paralisada de terror eu dou brecha pra dor eu me apiedo de estranhos eu me apiedo de conhecidos eu sou pau eu sou toda obra eu tenho pena de mim eu uso pena na orelha eu choro sozinha no quarto eu choro em público eu choro em cena eu me desfaleço em pranto eu rio alto eu mato por amor eu faço viver por amor eu sinto dores insondáveis eu amo quem não me ama eu sou um ponto de luz na escuridão eu sou arrimo de família eu quero casar e ter filhos eu amo instantaneamente eu me apaixono por nada eu me apaixono por tudo eu acredito em vida Eterna eu acredito em vida terna eu quero ser aceita eu só quero ser aceita (pra mim pra si pro sol) eu me perdôo eu dôo eu dou eu faço eu eu eu eu eu eu eu


me desapego de mim

Ser feliz por decreto
dá certo?

decerto

quer dê quer não

que seja discreto.
solidão
(mesmo que eu quisesse!)

o interior de mim é povoado demais
e os arredores ainda ecoam
os bichos fazem plantão:
mas o dia insiste em refletir-me em água

fui nascer assim
de forma hidráulica!
me esvaio
me banho
me alimento
em líquido
me liquido

me movo assim pelos dias:
sangue, lágrimas, suor e sacramento.

(ainda assim
não ter você por perto é estranheza
pois a contagem dos dias estava nas suas mãos:
fui comprar um sapato e me peguei conferindo sua opinião imaginária)


mas sigo
como consigo
com sigo
sem, sigo.
tudo enrigelado
sigo fraturada
alguém cometeu um elogio:
"você fica melhor só"

o que sabem elas
dos nós
dos nãos
dos enfins
e então
de mim?

aqui donde jorra águasanguedortristezarancormágoa
dos pulsos olhos patas asas de mim
da casa coração
agora sem sentido sem razão
(planto flores sabendo que não serão vistas)
me desaprendo.

daqui,
donde jorra escuridão

já jorrou amor

(e sei ainda irá
quando restem forças
quando a nau novamente atracar
noutros portos selváticos
que, espero, se acheguem
de belezas puras e desavergonhadas´
mais puros e atentos
pelo infinito de uma
nova era que, enfim
era nova)

mas por hora
floreio a tristeza com poesia.
coloca a mão aqui nuns dentros de mim
e me ensina a redescobrir quem eu sou

por que em dias assim que chove forte
a água de fora dá prá conversar com as de dentro
e tudo fica vaporoso, com o fogo das ventas.

você aparece depois da chuva
(me olha: são uns olhos fugidios)
acorda todos os monstros
sacode os cadafalsos
que eu protelava em mexer
gira as manivelas
se acotovela em sensata argüição.

o primeiro que fala é a mente: não
mas tudo se organiza na ação.
é irresistível tentar, atentar: atenção.

cíclico-mundo-deus-respiração
repetes os fatos para que eu diga não
e eu protelo: onde há rasgos na razão.
e na ação?

i n a ç ã o.
e olha que eu já nem gostava de domingos.