De volta ao cotidiano, ela olhava pela janela do avião avistando a grande metrópole a frente, abaixo, pelos lados. A direita o pôr do sol galáctico, de milênios de um planeta às vésperas de uma nova era. Em frente, a frente, do lado, ao lado, por fora, ao redor: a cidade iluminada, no longe-perto da escuridão da noite decantada.
O mundo ainda roda-vibrava e balançava no coração acostumado ao rio, como se fosse o rio o mundo, o escuro das águas as sombras-luzes das profundezas dos mistérios. As histórias, lendas, boatos, dizeres amazônicos impreganados de futuro e prenhes de presente na pele lambuzada do rio cor-de-chá.
Tonta, respirando forte prá conter o desespero do deslumbre de ser-fazer história, procura nos desenhos da cidade-luminária vestígios do imaginário selvático, como se fosse a cidade espelho de futuras constelações nos céus das eras vindouras.
Viu no desenho longínquo, pontos de luz que lembram a flecha-chave de um índio, conduzindo a nova era. As icamiabas, translúcidas como a aurora, oferecendo seus muiraquitãs ao grupo dos 64 iniciados com impecáveis mantos, flutuando com seu canto coral no galope dos tambores sagrados, anunciado pelo toque dos berrantes de longínquos ritos dionisíacos. No sem tempo do átimo-segundo que o translumbre durou, viu o transferir-se de eras do planeta bonito que anoitecia, nascia para o tempo novo que chegou.
Sorriu, como sorriem aqueles que viveram os mistérios – que têm esse nome por que assim o são – e notou que as luzes se aproximavam, e a cidade se desenhava a sua frente.
A cinza cidade era a realidade que deixara a há 7 dias-milênios e agora regressava, talvez menos gris pois dentro dela tudo recoloria. A certeza do novo tempo acalentava o estrondo do chegar.
Em terra, a viagem mítica finda.
Que a nova era seja bem-vinda!