como falar de saudades
se o sentido é a
é falta do que não sei?

tudo tão sem sentindo
saudade de um não vivido
falta de um sonhado

os sonhos
sonhos
sãos
são
sonhos
ou não?

um buraco
uma fenda
um portal macambúzio
uma brecha
um pensamento confuso
me levam
prá saudade
do que nem foi
em verdade
inverdade

de tão real o desejo
que já daqui
antevejo:
quando for
será sentido?
terá sentido
será ouvido?
será olvido?
vívido e vivido.
(dos sonhos de realeza)

em 1977
na américa do sul
nasce uma princesa
obesa
de lindos colants rosas
de grossas coxas amorfas
de riso frouxo
e língua mordaz

ela me lembra alguém
ela me lembra ela
dela me lembra
eu lembro dela
na casa dos espelhos tortos
ela pra mim olha
eu olho pra ela

esperpento espelho
ela cresce, eu escorro
eu dela corro
ela por mim padece
(mas quando foi que prometi
realizar os sonhos de realeza dela?)
ela é má e vil
olhando-me em pé
estirada na cadeira
eu, vil e alcoviteira
olho-a da cadeira
estirada em pé

se uma das duas pudesse
se uma das duas coragem tivesse
esquecer-se
entregar-se
perdoar-se
nenhuma sofreria
eu e ela,
embora iria

mas a amo de tal forma
sua sedutora figura
e
ela me venera de tal maneira
minha amorfa criatura

que deixá-la partir não podia
sua figura me captura
que ela não me abandonava nunca
ainda que o eterno não perpetue
cortá-la de mim afora, agora
e sair dançando pela rua
nua.

lembro-me com 4, 8, 12, 16 anos
o mesmo pedido insistente
prá primeira estrela da noite
na hora de cortar o bolo de aniversário
na brincadeira do cílios


(em qualquer nova moda que fizesse-se de pedidos)

era o mesmo pedido

que anos depois
se concretizou
não sem dor
(nunca sem dor)

agora estou aqui
tal Jack and Hide
com meus desejos de princesa realizados


achando na verdade


um saco.
PARA VISHNU
UMA MONTANHA É UMA ONDA


para mim, que sou lava
só uma onda me leva.