o começo do fim
teve também seu início
numa noite de outono propício
aos fins
prometia diversão
mas ofereceu pontadas.
senti meus ossos duros
por dentro da tenra carne
que se desfazia em exaustão

minha cabeça sentia
a pressão de um novo tempo
a lufada do vento
(os cabelos. ah. os cabelos)

olhava meus apelos
como se fossem longínquos
percebi que havia tudo
mudado
mudado enfim

quando dei por mim já era outra
já era um começo de fim

os apelos, suplicantes em dor
tão perdidos dentro de mim
nem eram sentidos
nem faziam sentir
e a vontade de felicidade
gritava por fim
enfim.

por dentro de mim.

Poema para o impossível


Por que foge de mim

Céu

Desejo?

Penso recompor teu corpo
Na parca memória respeitosa
Dos meus pequenos olhos devassos
(controlados. descompostos. descompasso.)

Sempre me lembro primeiro dos seus cabelos cobrindo teu pescoço e de como desejei tirá-los dali para que, então, coubesse minha boca.
Penso em como minha mão se encaixaria entre suas espáduas e de como seria fácil trazer seu corpo junto ao meu, quando elas estivessem lá e meus lábios em na tua orelha.
Inevitavelmente penso no seu cheiro. Fresco, como um amanhecer, após banho. E quando penso no seu cheiro pós banho, sempre enrubesço, pois então penso em como seria a água escorrendo pelo seu corpo. No seu corpo, sem roupa, aberto reluzente onde poderia, sendo meu, pousar meus olhos. Esses mesmos que agora fugiriam dos seus olhos, se eu pensar que um dia você descobriria o quanto te desejo (te desejo ainda, ou te desejaria a partir de agora, ou num tempo que não sei conjugar: pretérito do subjuntivo mais que perfeito).
E então a tua boca. Eu poderia aqui dizer, romântica, simpática, delicada, que penso no seu sorriso, no jeito que você mexe quando ri, e como eu me perco, sem que você saiba, no seu sorriso. E eu penso mesmo no seu sorriso. Mas se eu tiver que ser sincera, eu tenho que dizer que me pego pensando na temperatura, no gosto e no paladar da tua boca. De como seria encostar a minha boca na sua. Eu fecho os olhos e é então, como se um dia tivesse acontecido. No impossível do tempo, do seu tempo, meu tempo, seu beijo, seus encaixes.
E quando penso em encaixe, inevitavelmente penso em sexo. E aí, como estou pensando nisso mesmo, deixo o pensamento-desejo correr junto a água do seu corpo, junto do meu corpo e então não é mais pensamento, é desejo e corpo e vertigem sem ar e sem tempo. Esse tempo, ilusão da matéria. E é o encaixe do seu corpo, impossível ao meu toque nessa vida, desse jeito, agora: essa vida ilusão que deu de ser assim - e o que mais me intriga e revela é o que traz a dureza do não vivido (ainda ou nunca ou sempre ou quando?).
E abro os olhos e você não está. Ou não é você, não é ainda você, ou você já se foi da minha vida. E algo me protege da fuga. E algo te revela numa metáfora. Numa procura. Num sonho. Numa impossibilidade- desejo. Em outra mulher, numa lua. Numa possibilidade remota. Nessa bolha sonho que ninguém, nem você mesmo, tem direito de me tomar.