a manhã rompe
ou eu rompo amanhã
eu roubo
uma rosea aurora
para nós: amor
de fato,
o amor,
intacto
se revê
e revira
na cama.
há braços&pernas
em laços.

a manhã me rompe em raio de sol
num prisma d'água infinito
multiluzes primpilam
eu invento tradicionalíssimos gracejos
eu fundo o redivivo.
gatos bocejam
eu antevejo:
rompe amanhã
em rosea aurora
sou feliz
e o mundo lá fora.
os gerânios perderam o sentido
o sol perdeu o sentido
e eu sinto-me só

eu não contento o dia

meu coração tem falhado um pouco
te contei, não?
às vezes vem um sopro
em vez de um tum-tum
pensei em ir ao médico, ao psiquiatra, ao padre:
tudo o que fiz foi te contar.

ainda
guardei uns segredos pra você
numa caixinha cor de mão
o futuro escorreu pelos dedos da caixa
e caiu no chão.
amarrei um barbante no futuro
e gatinha diverte-se com ele agora.

tenho me envolvido com gerânios por sua causa
e agora os acho estúpidos e frios.


furei as paredes em horário proibido
pra te esperar balançando
a rede balançou sozinha a noite toda
como se fosse um cenário de um sonho
que eu não dormi o suficiente para sonhar
porque o sol atravessou a sala demasiado cedo


(tive um pesadelo horrível, amor
sonhei que morria
sem pode te ver de novo
sonhei que um caminhão me atropelava
e levava minha identidade
sonhei que era meu pai que morria
depois meu irmão morria
e o amor da minha família falia
sem mim
sonhei com morte e dor e abandono
enfim
abri os olhos e não te vi
amanhecia na minha mini bahia)


por quanto tempo ainda vou colher rododendros em vão?
ainda acho os gerânios bobos.

a vida segue segura
o futuro virá
te asseguro
quer a gatinha brinque com ele
ou não.
dói por frestas obscuras
a profunda reação a temporal

o mundo explode
eu, em prece
prezo por outros
porquês

todo tempo
magoa-me
na brecha

respiro
liberto-me
sou
sôo
no vento

um mar
contratempo

são tempos turvos,
de caos cruento

e eu não preciso disso.
se eu desenhar um sol
colado num deus hindu
cercado de querubins nus
na contraparte esquerda do meu tórax
e se eu colar uma cobra
subindo pelo meu cóccix
se enredilhando pelas têmporas
e se eu nem tiver tempo
de te explicar sobre a fênix
que se abriu em meu peito
e se mesmo sem jeito pra isso
eu resolver desenhar a faca
um coração na minha nuca
e se nunca isso fizer sentido
dentro das pregas do meu vestido
cor de sangue pisado
se eu resolver marcar meu corpo
com tudo ou nada que tenho sofrido
se ainda assim você não entendesse
e eu ainda desenhasse
peixes e mamutes escarlates
com arabescos traçados a lança
se meu torso eu cobrisse
de unicórnios tristes
de pégasos depenados
e se ainda desesperados
meus braços fossem pintados
com marcas das garras de onça
com que um dia foram marcados
e se eu desenhar um macaco
num trecho de braço despido
travestido de hanuman
e se no meu sexo eu desenhar uma rã
coberta de folhas secas
e se eu desenhar na minha buceta
um caminho de pedras santas
se perto das minhas ancas
você tiver que pagar as promessas
você se compromete?
e insiste?
pisando em brasa incandescente
e eu recitando pornografias pros seus parentes?
chamando a sua tia de porca de heliópolis?
e se mesmo assim eu ficar triste,
triste de não ter mais jeito
e  passar um dia inteiro
relatando meus defeitos
e declarando os meus direitos
pela idade adquiridos?
e se eu me sentar em lótus
por cinco dias seguidos
e me iluminar de repente?
(coisa que eu duvido, realmente)
e se na hora que eu parar
de soltar os vitupérios
você ainda conseguir,
por força de algum mistério,
por tua mão na minha testa
e me abençoar com alfazema
se você conseguir não ter pena
nem dó nem compaixão
nem raiva nem medo
e só me der a mão
para que eu possa me apoiar
e levantar
com uma mínima dignidade
se a gente se encostar e
conseguir andar lado a lado
reluzindo
e se o sol estiver se pondo
num fim de dia lindo
em que cai uma chuva fina
lavando a alma exposta
nos traçados da minha pele
que foi quase descomposta
e se escorrer toda tinta-sangue
com que a ira foi pintada
e a estrada parecer minimamente segura
com pedras de raros brilhantes
e em nada parecida com os antes
me acompanha nesse caminho?
me leva no seu encalço
que eu não piso mais em falso
e ainda recito poesia
ao pé do teu ouvido santo
servindo de acalanto
pras horas mais tediosas.
e que a brisa sopre serena
levando todas as penas
das horas que estive em brasa.




amanheceu-me girassóis
tomando lugar no peito.

num dia ensolarado
eu num escuro,
iluminada da sua lembrança.

anoiteceu
eu nem vi
fabriquei um sol em mim
com a réstia do seu cheiro

a noite
deitada
fiz um sol em mim
desenhado de carmim no peito
com efeito
era batom
mas bastou
pra te manter em mim


acordei antes do dia
e o sol carmim
nasceu 
no meu peito borrado
a cata do peito seu.