Fazemos assim: deixemos que passem as horas
na balela dos dias
enquanto o amor escorre pelos lastros.

Sinto falta de tudo, amor: de nós, dos gatos
das patas, da minúscula cozinha, sopas, pão.
Do cheiro de ração, do edredon com pelos,
do cheiro de café fraco e doce pela manhã,
do bom dia mau humorado,
do cheiro do teu primeiro cigarro.

Cachorros expressam a revolta pela minha ausência:
mordem-se, contrário da pacatice dos dias de sol,
quando eu tinha tempo de deitar-me com eles
e contigo.

Tempo: dizem relativo, e eu digo impositivo.
Eu perdi quase tudo que me importa:
não vi os meninos abrirem os olhos,
nem seus primeiros passos.
Não estava lá para rir do bichano no cesto.
Perdi a hora do café.
O cachorrinho já é um guardião.

O tempo das pequenas coisas passa,
e o das grandes, do trabalho, da adultice, fica.

E se aos poucos a casa se esquecer de mim, e eu não mais puder surpreendê-la ao amanhecer?
E se os gatos não mais me atenderem, e eu ficar a chamá-los, tola?
E os cachorros me estranharem, ao invés de brigarem por mim?
E as panelas mudarem de seu indefectível lugar e eu não mais me mexer na área que é minha da casa?
E se tu também já não te recordares de quem sou?
E se eu perder um pouco de mim nisso tudo?

Adultice!


Menineza.

2 comentários:

Anônimo disse...

como não me recordar? tudo isso, com vc no meio, é o que sou. Sempre.
Além do tempo, além do espaço

Anônimo disse...

Analinda, vamos tomar aquele café. estou de bobeira 24 horas por dia, sete dias por semana. Tem a peça que o Gustavo faz que a gente podia ver "A Boa Alma de Setsuan" lá no Sérgio Cardoso. vamos? Me liga, me escreve...
Falando em escrever, puxa!!!!